Normalmente o agente financeiro - quase sempre um banco ou uma financeira credenciada - efetua financiamento de veículos através do sistema de alienação fiduciária.
Em linhas gerais, este contrato funciona da seguinte forma: o cliente fica na posse veículo, mas o agente financeiro mantém a propriedade resolúvel do bem. De forma curta e grossa: enquanto o comprador não paga todas as parcelas do financiamento, o real dono do carro é o banco (ou financeira).
Quando o comprador originário não quer, por N motivos, continuar com o carro e decide "passar para frente" o veículo para que outra pessoa usufrua do bem e pague as parcelas do financiamento, ela deve, junto a instituição financeira, fazer uma transferência da dívida.
O problema é que na prática isso não é assim tão fácil. Os agentes financeiros possuem critérios rígidos para liberar financiamentos. A análise de crédito é pessoal e vinculada a uma série de variáveis de ordem subjetiva e objetiva, tais como análise em cadastros de proteção ao crédito, renda familiar auferida, possibilidade de manutenção dessa renda por período indeterminado, etc.
Desta forma, pode ser que a pessoa que irá ficar o carro daquele primeiro comprador, o que financiou o veículo, não possua as qualidades necessárias para uma transferência de dívida junto ao agente financeiro. Então, dá-se um jeitinho brasileiro. Quem financiou passa o veículo para outra pessoa (que não seria aprovada em uma análise de crédito) pagar.
A dor de cabeça começa quando a pessoa que deveria estar pagando as prestações não cumpre com sua obrigação. Como o devedor-fiduciante certamente assinou um contrato com o agente financeiro e ele emitiu um carnê ou boletos para o mesmo pagar, a obrigação continuará sendo oponível ao fiduciante mesmo que o veículo em questão nem esteja mais em sua posse.
Sendo assim, caso o particular que está com o veículo permaneça inadimplente, o fiduciante poderá ser surpreendido com uma visita do Oficial de Justiça com um mandado de busca e apreensão em mãos.
O que fazer?
Antes de tudo, é preciso alertar que toda esta prática descrita acima constitui crime.
"§ 2o O devedor que alienar, ou der em garantia a terceiros, coisa que já alienara fiduciariamente em garantia, ficará sujeito à pena prevista no art. 171, § 2o, I, do Código Penal.(Incluído pela Lei 10.931, de 2004)."
Superado este ponto, entendemos ser recomendado:
Se o Oficial de Justiça aparecer
Se por acaso o Oficial de Justiça surgir com um mandado de busca e apreensão do veículo em mãos, o recomendado é indicar o endereço correto de onde o bem se encontra para que ele seja apreendido. Uma vez que o carro volta à posse do agente financeiro, é possível sentar-se com a instituição e negociar. De toda forma, contrate um advogado para que te acompanhe durante a negociação.
Tente negociar com o particular que recebeu o carro
Proponha ao mesmo que te acompanhe até a instituição bancária para que, juntos, realizem a transferência da dívida com a anuência da financeira. Se não for possível, tente, pelo menos, pegar o carro de volta.
Mova uma ação de reintegração de posse
Importante lembrar que existe divergência quanto a possibilidade jurídica deste pedido, mas que dependendo do caso, estudado por seu advogado, pode se mostrar uma opção interessante. Alguns tribunais tem decidido no sentido de que os direitos adquiridos sob a égide da boa fé devem ser preservados. Desta forma, a possibilidade de uma ação de reintegração de posse depende de uma análise do caso concreto.
Diante do exposto, conclui-se:
"Passar para frente" veículos alienados fiduciariamente é crime.
Sem anuência do agente financeiro, mesmo sem o veículo em mãos, o devedor-fiduciante continua respondendo pelas prestações não pagas.
Se o Oficial de Justiça aparecer, indique o endereço onde o carro se encontra. Uma vez apreendido o veículo, sente-se com o agente financeiro e tente negociar.
Tente negociar com o particular que recebeu o carro para que ele devolva o veículo.
Peça ao seu advogado que analise e caso concreto e verifique se há possibilidade de manejar uma Ação de Reintegração de Posse.
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